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"Se é seu amigo, não peça uma key do jogo dele: compre para apoiá-lo!"
- HenriqueGibi

“Parabéns ”, consola o tigre [Leitura de 7 min]

Strong Rock

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30 de Julho de 2015
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Não sei se está bom, nem lembro se revisei. Só uma historinha para brincar um pouco, tempo faz que não escrevo.



Aquela era a época em que o homem comemorava seu nascimento.

Não gostava de grandes festas com muitas pessoas, mas fazia parte de uma grande família, além da dita-cuja ser uma muito renomada por seus negócios no mercado geral. O homem vivia conflitando com sua esposa pois esta apreciava festas bem elaboradas e estar rodeada de pessoas amáveis com seus dois filhos.

Mas o homem não cedia, então todas as suas primaveras eram comemoradas em seu vazio salão, sua esposa e filhos, e seu companheiro de negócios, um hábil feiticeiro, a quem confiava tudo. Dessa amizade ele fazia seu único grande tesouro.

Ainda tendo tantas coisas bonitas, ainda sendo rodeado por pessoas agradáveis, e ainda tendo alguém a quem podia confiar a vida, ele não sabia como isso era importante, como ele era afortunado. Ele era um homem tristemente apático.

O feiticeiro, vendo como seu amigo se sentia, quis dar-lhe um presente especial: uma caixa com sentimentos mútuos e alheios, uma semente de empatia. Estava muito excitado para dar o presente em que tanto trabalhou então, vestindo-se formalmente e colocando seu chapéu mais elegante, tingido de um púrpura vivo, com uma grande aba e um caro ornamento de pena, partiu logo para a mansão em que o amigo vivia. Chegando lá, saudou todos os quatro convidados do seu pequeno encontro entusiasmadamente, e logo apresentou a caixa. Entregou-a nas mãos do aniversariante, que depois de ser explicado o propósito do presente, encarou a embalagem fechada por um momento, e pôs-se a pensar.

Ora, o homem era consciente da sua notável deficiência de sentimentos sobre tudo: família, amigos e até mesmo sobre a realidade em que vivia, mas não era dessa maneira por pura vontade, era como um instinto. Ele simplesmente não conseguia sentir nenhum sentimento sobre as coisas ao seu redor, mesmo às coisas mais admiráveis, às que deveriam ser-lhe mais queridas, e isso o fazia se sentir um homem cinza.

Por outro lado, ele via as vantagens disso. Provavelmente, boa parte da sua habilidade em negociação era por conta da sua apatia: muitos dos seus inúmeros colegas e parentes tinham, cada um do seu modo, tristes e comoventes histórias e desventuras para contar-lhe, esperando que pudesse ajudá-los com uma pechincha ou, em piores casos, um fiado. Mas o homem cinza não se importava. Por mais que gostasse do pensamento de ser um homem dócil e sensível, só conseguia processar as informações do mundo ao seu redor pelo próprio ponto de vista.

Não apenas via as vantagens nos seus negócios, porém; imaginava que seria doloroso voltar a ter sensibilidade. Tudo que vinha a sua cabeça era a tristeza, a culpa, a raiva, a vingança, apenas o que poderia vir para lhe atormentar; se voltasse a sentir e a ter sentimentos mútuos, ele com certeza não tardaria a quebrar, pensou. Exitou por um momento, então olhou para a face esperançosa de seu amigo, olho no olho, e voltou a encarar a caixa ornamentada em suas mãos, balançando a cabeça.

Agradeceu o presente e recusou-o, estendendo a caixa que segurava de volta para o homem que a deu para ele. O homem de chapéu elegante franziu a testa, confuso. Questionou a decisão do homem cinza, que disse que temia o presente que lhe era oferecido. Isso enfureceu o mago profundamente, fazendo com que ele começasse a gritar com o aniversariante, dizendo como trabalhou naquele presente, como era algo que o ajudaria, como era injusto e indelicado rejeitar um presente feito com tanta consideração – prevendo essa discussão tomar um rumo desagradável, a dona da casa foi, junto de seus dois filhos, para o seu quarto, no andar superior. Os que ficaram no grande salão acompanharam com a visão a saída da mulher e seus filhos. O homem vestido de púrpura apontou para a retirada da família e culpou seu amigo.

O outro, a quem o presente foi direcionado, ficou surpreso com a reação do amigo, mas não se comoveu, deu a mesma razão anterior. Isso irritou ainda mais o amigo das esperanças quebradas. Ia voltar a gritar e discutir, mas parou, pois sabia que de nada adiantaria. A esse ponto já bastava, ele já estava cansado de tal ingratidão. Seus ombros estavam cansados de tanta raiva, mas ela não cessava de jeito algum. Ele soltou um suspiro de decepção, com um tom de impaciência.

Cuidadosamente, retirou o chapéu que estava sobre a sua cabeça, pôs das mãos sobre o vácuo do chapéu e pronunciou palavras impronunciáveis. Antes do homem apático dar um passo atrás, tentando evitar que algo de ruim lhe acontecesse, um enorme tigre saiu do chapéu púrpura abocanhando sua presa insensível de uma vez só, e já na ida de volta para o misterioso mundo de dentro do chapéu, mastigava o corpo com vontade, evidenciada por longas mordidas que, acompanhadas do silêncio do grande salão vazio, fazia uma sinfonia crocante e sanguinária.

O único homem restante no salão virou-se para as escadas ao escutar passos descendo os degraus, percebendo a viúva do cadáver, agora parada, calada, boquiaberta. Introduziu seu choro com um gemido desesperado ao ver o sangue e os restos do seu finado marido, então com uma mão segurou seu vestido para correr até a cena, e a outra pôs sobre a boca, incrédula. Chegando lá, passou sem nem mesmo olhar para o homem que lá estava parado, quase sobre os restos que anteriormente vira da escada, e caindo de joelhos sobre o sangue que manchava o fino tecido antes azul caribenho de vermelho escuro e vazio, se afogou em suas próprias lágrimas ao encarar o seu pior pesadelo, reunido e realizado em fatos.

O homem ao seu lado não fez nada além de assistir todas as ações da mulher ao perceber o que ele tinha feito com seu marido. “Ele não ligaria de qualquer modo, mesmo que estivesse aqui, vendo-a sofrer” ele pensou. No momento seguinte, porém, parou. Estacionou todos os seus pensamentos que armazenava até o momento para processar uma nova linha de raciocínio, que o fez realizar algo importante. Percebeu como estava terrivelmente distorcido, como estava vendo as coisas do ângulo errado.

Um feiticeiro criou uma cura, e usou-a como veneno. Feriu, para sempre, seu “paciente”, justamente por causa da “doença” que queria curar. Causou a dor que queria evitar que outros causassem. Esperou do “paciente” algo que era incapaz de fazer, graças à sua “doença”. Algo que só seria capaz de fazer ao usar a cura que o feiticeiro fez.

E ainda lá, em pé, próximo à viúva, com um último “eu matei meu amigo” abaixou sua cabeça, tristemente.
 
Então, no final das contas, literalmente, o feitiço se voltou contra o feiticeiro. Ele tentou dar cabo de um problema, e por infortúnio, arranjou um outro de proporção maior.

Gostei do texto.

Abraço!
 
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