Segredo das Luzes Pt.4
As outras partes podem ser encontradas na Academia de Letras.
Gritos, choro e sussurros atravessavam as portas das residências. Um clima sombrio se aproximava, com o receio do próprio futuro estar cada vez mais presente na mente das pessoas. Como sempre, o ar cheirava a morte. Morte acompanhada de destruição. Tudo isso era visível para Lirk. O garoto não era cego. Mesmo da janela segura de seu castelo real, podia ver e sentir tudo que estava acontecendo com as pessoas. Seu medo e sua angústia. Não queria ficar lá, sem ação, mas nenhuma alternativa lhe restava.
- Que raios de príncipe sou? Que raios de pessoa sou? Deixar todos em sofrimento para a minha proteção. Proteção ao rei é de mais sentido, sem ele, o reino nada é, ou pelo menos nada deveria ser. É a mim que o inimigo quer, é a mim que os luzianos querem. O arrependimento por ter tentado qualquer tipo de envolvimento com estes saqueadores. O arrependimento por ter participado daquela maldita competição de inventos na cidade onde o conhecimento para a construção do invento foi adquirido. Dizem que possuo alguma inteligência, mas os inteligentes não cometem tais erros. Do que adianta saber criar máquinas tão bem quanto a maioria dos engenheiros luzianos mas ser tão estúpido para outras coisas? - Termina seu solilóquio.
Depois de ver por sua janela o que fizeram, Lirk não se aguentou e pegou novamente seus equipamentos para se encontrar com eles. Algo deveria ser feito imediatamente, se era ele que os luzianos queriam.
Desceu as escadas, rapidamente mas com o mesmo cuidado para não se despencar dali, porque se fosse travar uma batalha, que fosse iniciá-la sem ferimentos ou vestes rasgadas.
O Castelo Aldebaran era grande e majestoso. Feito de tijolos reforçados com metais, possuía quatro torres altas (assim como todas as paredes do castelo) que formavam uma barreira de proteção ao seu redor. Janelas altas com grades com o formato do brasão Aldebaran. Um simples portão de madeira reforçado com ferro e grades metálicas que só podiam ser abaixadas por uma alavanca do lado de dentro. Uma pequena cachoeira artificial era formada na entrada, e suas águas passavam por debaixo da ponte da entrada, rodeando toda a área do castelo por dentro das muralhas.
- Bom, creio que não chegaremos num acordo. - Disse o homem encapuzado. As espadas estavam desembainhadas e as armas tecnológicas ativadas. Os homens de Kharl esperavam um ataque inimigo para atacar. Era o que faziam na maioria dos casos. - Não queria usar isso, mas não queremos ficar em desvantagem. Venha, Mechassassino Alpha.
As três portas do último dirigível se abriam. Em posição defensiva, os guerreiros de Aldebaran não conseguiam identificar aquilo que se aproximava. Mas os soldados luzianos sabiam, e seu líder também. Passos fortes foram ouvidos, sons de garras metálicas, e o chão tremia, assim como os guerreiros mais inexperientes. Licht não queria demonstrar medo, então se manteve firme. O barulho das garras seguiu uma terrível máquina, o chamado de Mechassassino Alpha, que saiu do dirigível com suas garras mecânicas.
- Lindo, não é? - Disse o líder, tirando o capuz. - Eu acompanhei seu desenvolvimento pessoalmente para me certificar que poderia destruir todo este reino insignificante!
Licht congelou. Reconhecia aquele rosto perfeitamente. Eles haviam entrado em combate na última guerra. O rosto um pouco envelhecido, mas era inegável.
- K-Krähe! - Gaguejou Licht. - Seu desgraçado, então andas cá após a última guerra, creio eu? Anda aproveitando as pilhagens e roubos? - O capitão se deixou levar pela emoção e começou a tremer. Algumas lágrimas sairam de seu rosto.
- Ora, vamos nos divertir um pouco, Licht! Não vamos falar dos erros do passado. Vamos falar dos erros do presente. O erro de vocês em não entregar-me o garoto Lirk! - Dizia Krähe às gargalhadas maquiavélicas. - Acabou. É metal contra metal. A consequência? Morte. Vá, Mechassassino Alpha!
Mechassassino Alpha tinha uma aparência assustadora. Com cerca de três metros de altura, se movimentava com garras de metal e tinha patas de caranguejo metálicas para atacar. Um corpo não muito robusto de ligas metálicas e uma cauda de escorpião no final. A cauda tinha duas armas acopladas, e ao lado dela saía fumaça. Que cheirava a morte.
- Bom, creio que vão ser destroçados tão brutalmente que nem gastarão espaço num cemitério. Podem se decompor facilmente. - Gracejou Krähe enquanto a máquina avançava escorrendo óleo. Os barulhos mecânicos eram quase ensurdecedores e a aparência do Mechassassino Alpha não era nem um pouco amigável.
- Certo, soldados. É chegada a hora. Preparai-vos para o combate. - Grita o capitão Licht com um pouco de esperança.
- Compreendido, Senhor! - Gritaram em coro os soldados ali presentes. Nenhuma pessoa era vista pelos arredores, por mais que checassem inúmeras vezes. E a máquina se aproximava lentamente, causando terror.
- Ora, o que pretendem fazer com suas lâminas inúteis? - Zombou Krähe. - Já disse-lhes, é metal contr...
- Lancem as gemas aquáticas! - Grita Licht interrompendo a zombaria de Krähe. Os soldados retiraram várias gemas azuis de seus bolsos e lançaram no Mechassassino Alpha. As gemas emanaram uma luz estranha, e uma explosão aquática surgiu atingindo a criatura mecânica. Faíscas saíram da máquina imediatamente. O Mechassassino batia as garras loucamente e tentava se movimentar, mas sem sair do lugar.
Então, o Mechassassino partiu a avançar para dentro da cidade do reino soltando faíscas, tão rapidamente que atropelou os soldados que ali estavam, os lançando para longe. A máquina andava aleatoriamente pelas ruas da cidade, ainda soltando faiscas. Em alguns segundos foi ignorada pelos homens dali para prestar atenção ao perigo principal. Krähe e os soldados luzianos.
- Ora, Licht. - Krähe solta uma risada nervosa. - Cada dia com técnicas novas. Que gemas interessantes. Que gemas bem feitas e formosas. Quero levá-las comigo, se me permite. Oh, que digo eu? Se me permite? Tomarei-as a força.
Krähe equipa armas em ambas as mãos, assim como todos os soldados luzianos. Os soldados do rei Aldebaran não haviam embainhado suas espadas até então. E o momento de usá-las havia chegado.
- Acalmem-se. A tática deles é avançar por nosso nervosismo, não se deixem abalar. - Disse Lirk. - Se há algo que possuem maestria, e talvez a única coisa que não foi fruto de saques e crimes hediondos, é em táticas psicológicas.
- Vossa Alteza, creio que o momento não é muito favorável. - Diz Licht. - Creio que deveria ficar feliz por tê-lo ao nosso lado, mas triste porque a ajuda do príncipe se mostra necessária?
- Lirk, então você apareceu! Que impressionante. - Krähe interrompe o diálogo com um deboche. - Seus soldados até que se deram muito bem enquanto você se negava a aparecer. Conseguiram deixar nosso Mechassassino Alpha desorientado com uma espécie de gema mágica, que eu terei muito prazer em roubar e aprender como são feitas. Mas creio que conhece os Mechassassinos, não é?
Lirk treme e range os dentes. Então eles sabem, pensou. Ainda sobrava alguma esperança que não se tratasse realmente daquilo, mas não pôde arriscar vir e saber antes. A verdade seria revelada a todos os soldados naquele momento e era impossível que mantessem segredo. Mas a revelação seria muito menos dolorosa se sua ajuda contribuísse para a salvação do reino.
- Quer que eu conte o que fez agora ou depois, Lirk? - Disse Krähe, notando o nervosismo do príncipe. - Melhor contar agora, assim já teremos algum lucro nesta luta logo de antemão.
Passos foram ouvidos ao longe, e todos se viraram para ver. Reforços foram chamados por Lirk, e se aproximavam à cavalo. O capitão Lefty e o grão-mestre Saurier chegavam com seus soldados para ajudar no combate. A máquina passou por eles, que olharam de relance, um pouco amedrontados, mas ignorando a situação e seguindo em frente de qualquer modo.
- Que ótimo, mais reforços. - Disse Krähe revirando os olhos. - Bom Soldados luzianos, se não começarmos agora vai ser mais complicado. Avancem!
Notando o que estava realmente a acontecer, os reforços avançaram mais rapidamente para chegar a tempo ao combate, pois até então não sabiam que era aquilo que estava acontecendo. No momento em que chegaram no local, golpes já eram desferidos com as espadas e tiros elétricos já atingiam soldados armadurados.
- Vossa Alteza? Não tenho conhecimento das ocorrências atuais, mas temo que não sejam boas novas. - Disse o capitão Saurier notando o estranho combate entre lâminas e armas de tiro.
- Não creio que temos tempo para conversas, Grão-Mestre Saurier! Capitão Lefty também se encontra, pelo que vejo. Por favor, peço que ouçam o que tenho a dizer rapidamente. - Disse Lirk enquanto dois luzianos tentavam o surpreender pelas costas durante sua luta com aquele que estava em sua frente.
- Atenção! Retirem suas armaduras. Sei que ficarão desprotegidos, mas ouçam! As armas de choques elétricos dos luzianos podem ser uma grande desvantagem. Algo como cota de malha pode causar menos danos. Contra os soldados, basta o uso de gemas flamejantes para afetar a camada de proteção externa! - Explicou Lirk em voz alta depois de acertar tiros de fogo em soldados luzianos.
Gemas flamejantes funcionavam aparentemente do mesmo jeito que as gemas aquáticas. O artefato era lançado e ao acertar o alvo, uma explosão de fogo surgia no ar. Poucos sabiam o que fazia aquilo acontecer, se era magia ou tecnologia.
Aos poucos, os soldados retiravam as armaduras pesadas e atiravam as últimas gemas flamejantes que restavam. Não demorou para que os soldados luzianos com a fraqueza revelada fossem derrubados. Krähe formava enquanto isso uma barreira com corpos desmaiados ou mortos para eletrocutar os que ainda estavam armadurados. Na ausência de gemas flamejantes, a boa e velha lâmina serviu. Com a melhor mobilidade permitida pela cota de malha ficou um pouco mais fácil desviar dos choques elétricos que demoravam um pouco para carregar.
O combate parecia uma fantasia. Como se fossem duas eras se colidindo, a medieval e a industrial. Cada uma com seus truques e suas técnicas tentando se manter em vantagem. Lâminas cortando, armas atirando choques elétricos e chamas, gemas sendo atiradas e explodindo em ataques mágicos.
Em poucos minutos, metade dos soldados de ambas as partes já haviam caído. Alguns mortos, outros apenas imobilizados e feridos.
- Creio que tomamos o controle da situação, Vossa Alteza! - Disse com um leve sorriso o capitão Lefty.
Passos pesados foram ouvidos e todos se viraram para a cidade. O Mechassassino Alpha voltou ao controle e estava obedecendo as ordens de Krähe para atacar. Procurando nas bolsas, notaram que nenhuma gema sobrou para lutar com a monstruosidade mecânica que se aproximava rapidamente.
- Como pretendia dizer antes mesmo de saber desta ocorrência - Dizia Lirk revirando os olhos. - Não devemos nos proclamar vitoriosos sem uma vitória.
As gargalhadas cada vez mais altas de Krähe foram ouvidas por todos. Poucos luzianos e guerreiros do reino sobraram, sendo que a grande maioria estava ou com ferimentos, ou imobilizada ou alguns que estavam mortos.
- Creio que - Ironizou Krähe. - Tomamos o controle da situação, Vossa Alteza! - Finalizou a frase gargalhando cada vez mais alto.
Continua em breve...